A dádiva dos encantes

As criações de Fernando França chegaram ao Museu do Amanhã provocadas pelo encontro do G20, que aconteceu neste espaço durante a primeira semana de outubro. Alinhada ao eixo temático “A vida é inteligente”, a exposição no Museu do Amanhã foi estendida até o dia 3 de novembro, abrindo-se para o público visitante.

Em 2024 e 2025, o Museu do Amanhã celebra todas as inteligências — humanas, não humanas e mais que humanas — para discutir como, em colaboração e sinergia,  elas poderão conduzir tudo o que vive neste planeta a um estado coletivo de bem-estar. As criações de Fernando França dialogam com mitos e sonhos de sua terra natal, Rio Branco, Acre, e convidam o visitante a refletir sobre as complexas relações entre cultura, meio ambiente e identidade. Suas obras, que transitam entre o desenho e a pintura, emergem da sensibilidade às narrativas locais e globais, tecendo um diálogo entre o imaginário amazônico e as questões contemporâneas de sustentabilidade.

Fernando França é desenhista, pintor e mestre em Literatura Brasileira pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Já participou de várias exposições e mostras coletivas no Brasil e no exterior, incluindo França e Portugal.

Poucos são os artistas que podem afirmar dar vida aos encantados, seres esses que recebem a graça de existir através do mistério do invisível. Fernando França se destaca ao criar, em suas obras, as riquezas das cosmovisões amazônicas, apresentando criaturas que não habitam em nenhuma margem do rio, mas fluem numa “terceira margem”, simbolizando a fluidez entre o humano e o místico. Sua arte transcende a representação, mergulha num diálogo entre sonho e realidade.

A pintura de Fernando, construída com o aval do fantástico, desconstrói essa realidade e desvenda a mentira que é, em nome da civilidade, formatar identidades sem direito ao sonho. Dona Zenaide, uma pajé paraense, convive desde criança com os Karunas na Ilha do Marajó e recebe deles as canções que utiliza para instaurar o poder de cura. Essas mesmas canções revelam o recado mágico e curativo dos seres das águas, nos dizendo que somos água dentro e fora dos rios que fluem internamente em nós.

Além de uma expressão estética, a arte de Fernando é uma experiência sensorial e poética. Ao se conectar com a floresta Amazônica, ele compartilha saberes que iluminam e renovam nossa compreensão de mundo. Sua visão artística nos oferece uma nova forma de ver, permitindo o dom de sonhar através de uma poética milenar que nos renova e dá direito a uma arte e alma luminosas.