Novos vizinhos cósmicos | Museu do Amanhã

Novos vizinhos cósmicos

Observatório do Amanhã
Ilustração: a estrela anã (laranja e grande) TRAPPIST-1 e sete planetas menores na cor cinza em sua órbita / Foto: NASA / JPL-Caltech

Por Cássio Leandro Dal Ri Barbosa*

O conhecimento está em constante movimento e sua fronteira avança a passos cada vez mais largos. Há menos de 100 anos, acreditávamos que a galáxia de Andrômeda, assim como todas as "nebulosas espirais" conhecidas faziam parte da Via Láctea. A detecção do primeiro planeta fora do nosso sistema solar – ou exoplaneta – se deu há apenas 25 anos e hoje já são mais de 3 mil conhecidos! Por mais irônico que pareça, sabemos mais sobre uma galáxia a mais de 2 milhões de anos luz de distância do que sabemos sobre nossos vizinhos cósmicos.

Ao nosso redor, a uma distância de “apenas” 50 anos luz, podemos encontrar milhares de estrelas. Para chegar a elas, é preciso viajar por 50 anos à velocidade da luz – estonteantes 300 mil quilômetros por segundo, o que é mais que um trilhão de quilômetros por hora. Em termos astronômicos, se fosse possível viajar a esta velocidade, cinco décadas seria como ir “logo ali” – mas em termos humanos, este “logo ali” está infinitamente longe de nós.

Nesta vizinhança, está a estrela mais próxima de nós, Alfa Centauri. Ela nos mostrou a existência de um exoplaneta similar à Terra. Encontrar um planeta novo, mesmo que seja no nosso Sistema Solar, não é tarefa fácil – exige tecnologia de ponta, mas também boas doses de persistência e paciência. A descoberta de um novo planeta envolve observações contínuas de uma estrela candidata a possuir um cortejo de planetas por meses a fio. Às vezes por anos até. Em alguns casos, são registradas minúsculas alterações do brilho da estrela todas as vezes que um planeta passa à sua frente. Já em outros, procura-se medir o "bamboleio" promovido pelo puxão da gravidade que os planetas promovem na sua estrela-mãe. Em ambos os casos, esses efeitos só se tornam evidentes após muito tempo observando o sistema.

Outro olhar cuidadoso sobre uma estrela sem nenhum atrativo especial da constelação de Aquário, a meros 40 anos luz de distância, nos presenteou com nada menos que sete planetas muito semelhantes à Terra. Dentre os novos vizinhos, três se encontram em uma região propícia a manter água em estado líquido, temperatura ideal para sustentar vida. O próximo movimento será verificar se existe mesmo água.

E se existir de fato, o que isto pode significar para a civilização humana? Muita coisa, pois as chances de haver vida nesses planetas são enormes! A vida como conhecemos é baseada em água. Procurar por vida fora da Terra é procurar por água em outros planetas. Poderemos finalmente responder a pergunta que há milênios permanece sem resposta: "Estamos sozinhos no universo?".

Isso certamente não significa que nos mudaremos para um destes planetas nos próximos anos ou décadas – ou mesmo nos próximos séculos. Viagens interestelares com velocidades próximas à velocidade da luz ainda são objeto de ficção científica. No momento, o lugar mais distante que temos possibilidades reais de alcançar é Marte, que está a mais de 70 milhões de quilômetros de nós. A viagem até lá é bem mais curta, mas mesmo assim dura mais de seis meses viajando a 60 mil quilômetros por hora. 

Marte, no entanto, está “pertíssimo” em termos cósmicos. Chegar à estrela mais próxima exigirá muito mais esforço em termos de pesquisa e desenvolvimento das agências espaciais do mundo inteiro. Se um dia, no entanto, tivermos chances reais de fazer uma viagem interestelar, ainda enfrentaríamos sérios dilemas éticos enquanto espécie. Quem levaríamos primeiro? Que garantias teríamos de conseguir chegar ao exoplaneta habitável mais próximo sem nenhum acidente no caminho – e poderíamos garantir o retorno dos viajantes? Conseguiremos manter a humanidade viva e nosso planeta habitável até termos estes questionamentos com que nos preocupar?

Os seres humanos promovem mudanças no seu entorno há milênios, mas nunca essas mudanças foram tão impactantes e rápidas; estamos no Antropoceno, uma nova época geológica. As mudanças estão tornando nosso planeta um ambiente inóspito aos próprios seres humanos em um curto espaço de tempo e de maneira irreversível. No ritmo atual, antes mesmo de conquistarmos Marte, estaremos malfadados a enfrentar alterações climáticas severas que trarão, em última instância, fome e sede. Uma viagem de escape, seja para Marte, seja para um dos planetas recém descobertos, não figura na lista de possíveis soluções. Nosso planeta tem diversos semelhantes, mas continua único e a melhor coisa a fazer é cuidar para que ele não se torne inabitável. Como diziam nossas avós: "cuide bem do que você tem!".

*Cássio Leandro Dal Ri Barbosa é doutor em astronomia pela Universidade de São Paulo e professor do Centro Universitário da FEI, em São Bernardo do Campo (SP). Além de pesquisa e ensino, atua em divulgação científica em diferentes mídias há mais de 10 anos.

O Museu do Amanhã é gerido pelo Instituto de Desenvolvimento e Gestão – IDG, e conta com patrocinadores e parcerias que garantem a manutenção e execução dos projetos e programas ao longo do ano. O projeto é uma iniciativa da Prefeitura do Rio de Janeiro, concebido em conjunto com a Fundação Roberto Marinho, instituição ligada ao Grupo Globo.